20/05/2014

Velho




"Velho sente saudade de mãe e de pai. Tudo faz tanto tempo! Velho quer colo, quer colher na boca vindo de longe com motor de aviãozinho, quer  - banho tomado - que o ponham na cama, o aconcheguem com lençol limpo e travesseiro macio. Uma história conhecida, uma cantiga de ninar, um beijo de boa-noite. A porta do quarto um pouquinho aberta, com a luz do corredor acesa - o ponto de referência é sempre bom. Velho sente falta de instância superior. Quem o julgará com isenção e sabedoria? Quem, melhor que ele, saberá, imparcial, examinar o mérito da questão? Velho é criança de fôlego diferente. Já não lhe interessam as correrias nos jardins, o sobe e desce das gangorras, o vaivém dos balanços. É tudo muito pouco. O que ele quer agora é desembestar no céu, soltar os bichos que colecionou a vida inteira."
 
Arroz de Palma, Francisco Azevedo

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